Dois anos sem Kelton Marques: família teme novo adiamento em júri de Ruan Macário
O pai de Kelton, Jailson de Souza, teme que o adiamentos sejam manobras para conseguir tempo de ter um habeas corpus aceito
Nesta segunda-feira (11), completam-se dois anos desde a morte trágica do motoboy Kelton Marques, um acontecimento que abalou não apenas sua família, mas toda a Paraíba, principalmente o segmento de motociclistas. A expectativa da família era que o acusado pela morte de Kelton, o empresário Ruan Ferreira de Oliveira, conhecido como Ruan Macário, estivesse enfrentando um julgamento nesta semana. Contudo, o julgamento foi adiado, gerando indignação e frustração entre aqueles que aguardam justiça.
Ruan Macário deveria estar diante de um júri popular no dia 14 de setembro de 2023, acusado de homicídio qualificado com dolo eventual. Esse tipo de homicídio ocorre quando alguém assume o risco de matar outra pessoa. A defesa do acusado alega que o adiamento se deu devido a um choque de pauta, uma vez que havia outra audiência marcada para o mesmo dia.
Em conversa com a Rede Tambaú de Comunicação (RTC), a família de Kelton teme que esse adiamento seja uma manobra para que algum dos pedidos de habeas corpus pedidas na justiça seja aceito. A família do jovem acredita que Ruan vai ser condenado e sugeriu que ele estaria tentando deixar a prisão antes do júri popular. Há grande expectativa pelo julgamento, afirma a família.
"Na real, o que eles querem é encontrar uma brecha para soltar o Ruan Macário antes do júri popular", Jailson de Souza (pai de Kelton Marques)
Jailson de Souza, pai de Kelton Marques, expressou sua frustração: "A gente já esperava essa manobra porque ele está sendo representado por um escritório de advogados que tem muitos advogados. Essa desculpa para o adiamento que eles iriam ter outra audiência no mesmo dia não justifica porque é um escritório de advogados associados; qualquer um pode representar o Ruan Macário. Então isso aí não justifica. Mas é uma manobra deles. Na real, o que eles querem é encontrar uma brecha para soltar o Ruan Macário antes do júri popular porque Ruan Macário vai ser julgado pelo júri popular e com certeza, toda a certeza que eu tenho, é que ele vai ser condenado porque o que ele fez com o meu filho foi um assassinato", desabafou.
O pai de Kelton também revelou que Ruan Macário já havia acumulado R$ 7.840 em multas no carro que estava envolvido no acidente que resultou na morte de seu filho. Ele enfatizou que o acidente não foi um mero incidente de trânsito, mas sim um assassinato. Jailson de Souza espera que o julgamento aconteça para que Ruan Macário seja condenado e cumpra sua pena.
As filhas de Kelton
Kelton Marques deixou um legado de duas filhas, e seu trabalho como motoboy durante a madrugada era fundamental para complementar a renda e sustentar suas crianças. A avó das crianças relatou que a filha mais nova ainda não compreende totalmente que o pai não voltará mais. Ela frequentemente acredita que qualquer motocicleta que passa pela rua é conduzida por seu pai, o que torna a situação ainda mais comovente.
A família informou ainda que a filha mais velha, desde a morte do pai se tornou mais reclusa, ficando constantemente fechada em seu quarto. O avô chegou a relatar que a mais nova corre em direção à porta ao ouvir um barulho de moto e exclamando: "O papai chegou".
O pai de Kelton descreveu seu filho como um indivíduo acolhedor e sorridente, alguém que sempre recebia as pessoas com um sorriso no rosto.
O Trágico Episódio
A vida de Kelton Marques chegou a um fim brutal e inesperado na madrugada de 11 de setembro de 2021. Enquanto voltava para casa após concluir seu turno de trabalho como motoboy, Kelton foi atingido por um carro que estava a uma velocidade impressionante de 163 km/h e que ultrapassou o sinal vermelho. Além disso, no veículo envolvido no atropelamento, foram encontradas latas de cerveja e drogas, segundo a polícia.
O motorista, Ruan Macário, fugiu do local sem prestar socorro e permaneceu foragido por quase um ano. Durante esse período, a família de Kelton Marques teve que seguir adiante com uma ferida emocional profunda e difícil de cicatrizar.
Após o atropelamento, foram encontradas imagens de Ruan Macário próximas ao local do acidente, mas ele desapareceu em seguida. Um mandado de prisão preventiva foi emitido pela 3ª Vara Criminal de João Pessoa por homicídio qualificado. A defesa afirmava que Ruan se entregaria à polícia em breve, mas ele só se apresentou dez meses após o crime, em julho deste ano.
Proposta da Defesa e Prisão de Ruan
Logo após a morte de Kelton Marques, a defesa de Ruan Macário tentou fazer contato com a família da vítima. De acordo com Camila Marques, irmã do motoboy, a defesa ofereceu ajuda financeira à família após o acidente. A ideia era que o pai de Ruan contribuísse com parte das despesas, uma vez que Kelton deixou esposa e duas filhas pequenas.
Ruan Macário se apresentou à polícia em 29 de julho, após 10 meses foragido, na Delegacia de Catolé do Rocha, na presença de seu advogado. O mandado de prisão foi cumprido imediatamente. Durante seu interrogatório, ele optou por permanecer em silêncio, manifestando a intenção de responder apenas em juízo. Posteriormente, foi encaminhado para a prisão da cidade.
Desde sua prisão, a defesa de Ruan Macário entrou com vários pedidos de habeas corpus, sendo todos negados. O último pedido foi negado em julho deste ano, e a expectativa é que o julgamento finalmente ocorra para que a família de Kelton Marques possa encontrar algum conforto após essa tragédia.
Manifestações de motoboys
Desde que que a tragédia aconteceu, motoboys se uniram para fazer mobilizações cobrando justiça por Kelton Marques. Na maioria das vezes os protestos eram organizados no local onde o acidente aconteceu, na Avenida Flávio Ribeiro Coutinho, mais conhecida como Retão de Manaíra. Além das mochilas térmicas estampadas com o rosto de Kelton, os motoboys vestiam-se com camisas em homenagem ao colega de profissão.
Dados do Ministério da Saúde, a taxa de internação de motociclistas passou de 3, 9 por 10 mil habitantes para 6,1 por 10 mil habitantes entre 2011 e 2021 – um aumento de 55%, considerando apenas a rede do Sistema Único de Saúde (SUS) e conveniados. Ainda de acordo com o MS, o número de mortes de motociclistas por lesões no trânsito em 2021 foi de 11.115, assim a taxa de mortalidade foi de 5,8 mortes por 100 mil habitantes.
Os dados são de um relatório divulgado pela pasta em abril de 2023, sinalizando o cenário brasileiro das lesões de motociclistas no trânsito entre 2011 e 2021. De acordo com o boletim publicado, no Brasil, em 2020, lesões por acidentes de trânsito foram responsáveis por mais de 190 mil internações nos hospitais do Sistema Único de Saúde (SUS) e hospitais conveniados. Destas, mais de 61% eram de motociclistas.
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