Wilson Santiago enfrentará conselho de ética com histórico corporativista
Afastado por ministro do STF, Wilson Santiago retomou mandato após votação da Câmara e passará agora pelo Conselho de Ética
O colegiado que deverá analisar o provável pedido de cassação do mandato do deputado federal Wilson Santiago (PTB-PB), o Conselho de Ética da Câmara tem um histórico de raramente punir os membros da Casa.
Além disso, dos seus 21 titulares, apenas 4 votaram pelo afastamento do petebista na sessão de quarta-feira (5), que anulou uma decisão do STF (Supremo Tribunal Federal).
Santiago foi denunciado pelo Ministério Público sob a acusação de desviar verbas de obras contra a seca no sertão da Paraíba.
Ele foi afastado do mandato no final de dezembro de 2019, em decisão do ministro do STF Celso de Mello, sob o argumento de que a sua manutenção no cargo representava ameaça às investigações.
Em votação, a Câmara, porém, decidiu derrubá-la e devolver o mandato a Santiago, para que ele responda às acusações no próprio Parlamento.
Na atual legislatura, há 19 representações apresentadas ao Conselho de Ética, sendo que 4 já foram arquivadas. Outras 11 não tiveram conclusão e uma foi retirada pelos proponentes.
Apenas dois casos tiveram conclusão distinta: em um foi aprovada recomendação de censura verbal ao deputado José Medeiros (Pode-MT) por ter xingado um colega.
Em outro foi aprovada a recomendação de suspensão do mandato, por seis meses, do deputado Boca Aberta (Pros-PR).
A punição, por ter xingado colegas e ter feito um vídeo atrapalhando o funcionamento de um hospital, tem de ser votada pelo plenário para que entre em vigor —enquanto isso, o parlamentar segue esbravejando da tribuna em todas as sessões.
Levantamento feito pela Folha mostra que desde 1988 apenas 1 em cada 4 casos que chegaram ao colegiado resultou em perda de mandato —e nem sempre motivado pelo voto dos membros.
Das 143 representações enviadas ao longo dos últimos 32 anos e que já tiveram conclusão, 34 culminaram em cassação —ou seja, 24% do total. Já 54 foram arquivadas pelos membros do colegiado, cerca de 37% dos casos concluídos.
No último caso de cassação da Casa, por exemplo, o ex-deputado Paulo Maluf (PP-SP) tinha um processo em andamento, mas perdeu o mandato por decisão da Mesa Diretora.
Isso acontece porque os processos do conselho são geralmente lentos no andamento, e falta disposição dos congressistas para cassar seus pares, o que poderia gerar um precedente futuro e prejudicá-los.
O mais notório dos cassados em anos recentes, Eduardo Cunha (MDB-RJ) é um exemplo. O ex-presidente da Câmara ficou 355 dias em julgamento no colegiado, e a pressão popular por sua queda foi fundamental para o desfecho, que ficou em 11 votos a 9.
O Conselho de Ética é formado a maior parte por integrantes de siglas do chamado centrão, que capitanearam a votação de quarta favorável de Santiago.
O mapa de votações mostra que, dos integrantes do colegiado, apenas 4 —Marcelo Freixo (PSOL-RJ), Tiago Mitraud (Novo-MG), Delegado Waldir (PSL-GO) e Fabio Schiochet (PSL-SC)— votaram a favor da manutenção da suspensão do mandato.
O resultado da deliberação no plenário na quarta, porém, não significa que o placar do conselho esteja fechado.
A primeira votação teve como pano de fundo a disposição da Câmara de mandar um recado para os ministros do STF de que a decisão sobre mandatos parlamentares cabe apenas aos seus pares. E que o Conselho de Ética é o local adequado para tratar desse tipo de caso.
A análise do caso pela Câmara começou nesta quinta-feira (6), em um rito que pode levar meses até uma conclusão.
O caso chegou às mãos do corregedor da Câmara, Paulo Bengtson (PTB-PA), que é do partido de Santiago e será responsável pelo passo inicial: a elaboração, após ouvida a defesa do petebista, de um parecer a ser analisado pelos sete deputados que compõem a Mesa da Câmara, entre eles o presidente, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
Eles podem tanto arquivar o caso quanto aprovar o envio da representação ao Conselho, que deve ser o caminho adotado nesse caso.
O Código de Ética da Câmara classifica o recebimento de vantagens indevidas no exercício do cargo —a principal acusação do Ministério Público contra Santiago— como procedimento incompatível com o decoro parlamentar, tendo como única punição cabível a perda do mandato.
Esse período de análise da Corregedoria e a consequente votação pela Mesa deve durar de duas a três semanas. Ou seja, pode ficar para depois do Carnaval.
Só haverá atalho caso algum partido político decida apresentar diretamente ao Conselho de Ética uma representação contra Santiago. Se isso ocorrer, a fase da corregedoria não é necessária.
Após receber a representação —da Mesa ou de algum partido político—, o Conselho de Ética instaura o processo, escolhe um relator e notifica novamente Santiago para que apresente a defesa, iniciando, a partir daí, a fase de instrução.
Todo o procedimento no Conselho até a decisão final, pelo arquivamento ou cassação, teria que ocorrer em até 90 dias úteis, mas geralmente esse prazo é extrapolado.
Qualquer que seja a decisão do Conselho, ela é submetida ao plenário da Câmara dos Deputados, que, em votação, aberta, tem a palavra final. Santiago só perde o mandato caso decidam assim pelo menos 257 dos 513 parlamentares.
Santiago foi afastado do mandato no final de dezembro de 2019 em decisão do ministro Celso de Mello, decano do STF, sob o argumento de que a sua manutenção no cargo representava ameaça às investigações.
Contra ele há, entre outros pontos, vídeos gravados pela Polícia Federal indicando a suspeita de que propina foi entregue em seu gabinete e em seu apartamento.
Os ministros do STF Marco Aurélio e Gilmar Mendes afirmaram que a decisão da Câmara é constitucional e não gerará rusgas entre os Poderes.
Eles manifestaram discordância, entretanto, em relação à possibilidade, aventada pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), de a Mesa Diretora da Casa deixar de cumprir a decisão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) de cassar o mandato da senadora Juíza Selma (PODE-MT).
"O tribunal [TSE] comunica [o Senado sobre a cassação] e claro que se presume a observância", disse Marco Aurélio. "Pela Constituição, [a análise da Mesa do Senado] não é um ato simplesmente formal. Claro que se imagina uma harmonia [entre os Poderes], e não um descompasso", afirmou.
"Eu tenho a impressão que isso [decisão da Mesa do Senado] é apenas análise do cumprimento das formalidades, se de fato se fez um julgamento correto, se estavam todos os juízes", disse Gilmar.
ENTENDA O CASO DE WILSON SANTIAGO
A acusação O deputado federal Wilson Santiago (PTB-PB) é acusado pelo Ministério Público de desviar verbas da construção da Adutora Capivara, em Uiraúna, sertão da Paraíba, no valor de R$ 24,8 milhões
CitadosAlém de Santiago, estão envolvidos o prefeito de Uiraúna (PB), João Bosco Nonato Fernandes (PSDB), que ecsondeu maços de dinheiro na cueca, e 5 mais pessoas
PropinaA investigação indica que houve acordo para que 10% do total da obra fosse devolvido ao parlamentar e 5% ao prefeito. O deputado teria ficado até o momento com R$ 1,2 milhão em propina
Ações controladasHá vídeos feitos pela Polícia Federal mostrando que propina teria sido entregue no gabinete do parlamentar, na Câmara, e em seu apartamento em Brasília
Decisão do STFEm dez.19, o ministro Celso de Mello decidiu afastar Santiago. Celso citou decisão do colega Teori Zavascki, morto jan.17, que havia julgado compatível com a ordem constitucional a possibilidade de o STF decretar a suspensão de mandato de parlamentar
Câmara derrubaNa quarta (5), Câmara derrubou decisão de Celso de Mello e reintegrou Santiago à Casa por 233 votos a 170
COMISSÃO DE ÉTICA DA CÂMARA
- 143 representações enviadas desde 1988 foram concluídas
- 34 culminaram em cassação do mandato
- 54 foram arquivados
Na legislatura atual
- 19 representações apresentadas nesta legislatura, das quais 4 foram arquivadas e 1 foi retirada; 11 permanecem sem conclusão
- 21 deputados integram a comissão, dos quais apenas 4 votaram para manter Santiago afastado.
- Dois homens ficam feridos ao caírem de motocicleta sem capacete em Cabedelo
- Bandidos invadem mercadinho e fazem funcionária refém em bairro de João Pessoa
Folha de São Paulo