Em carta a Lula, economistas propõem volta do Bolsa Família
Carta elaborada por profissionais de todo o país traz propostas e ações para o novo governo
Economistas brasileiros, reunidos em João Pessoa, na Paraíba, elaboraram um documento que será entregue a equipe do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A alteração da política de preços da Petrobrás, retorno do Bolsa Família, abrangência do SUS (Sistema Único de Saúde) e revisão da legislação trabalhista contra precariedade, estão entre os pontos da carta.
A carta traz uma síntese do pensamento dos profissionais sobre as necessidades de propostas e ações para o país, a partir desse novo cenário político.
Para o grupo de conomistas, o maior desafio do próximo governo é restaurar instituições e políticas públicas que possibilitem a governabilidade do país voltada para a promoção de elevado crescimento econômico, inclusivo, sustentável, com estabilidade de preços e aumento do bem-estar.
O êxito nesse desafio dependerá de uma série de ações, dentre as quais consideramos as mais importantes:
a – Instituir um novo arcabouço fiscal, que acomode política anticíclica e de promoção dos investimentos, da produtividade e da redução das desigualdades. Redefinir o conjunto de regras fiscais, revogando o teto de gastos que, além de disfuncional, é um mecanismo que inviabiliza qualquer política social ou de crescimento, ao longo do tempo, na medida em que a população cresce, aumentando a demanda por essas políticas, o PIB cresce, expandindo a capacidade de financiamento, enquanto gastos per capita e em relação ao PIB vão ficando cada vez menores.
b – Manter o controle da inflação com taxas de juros menores, por duas linhas de ação. Por um lado, o governo agindo diretamente nos mercados do setor real, com medidas como mudar a política de preços da Petrobras; fazer alterações em impostos indiretos, como os de exportação e importação; recompor estoques regulatórios e estruturar uma matriz energética mais barata e limpa. Por outro lado, fazer interlocuções com o Banco Central para ajustes no modelo de política monetária que permitam praticar taxas de juros mais baixas com efeitos satisfatórios no controle inflacionário.
c -Reaver ativos e investimentos das estatais estratégicas, com avanço nas cadeias produtivas, revertendo a atual estratégia de desmonte, garantindo capacidade de desenvolvimento científico, tecnológico e social. No caso da Petrobrás, alterar a política de formação de preços, que privilegia a distribuição de dividendos, em detrimento dos consumidores, dos projetos de investimento da própria empresa e de sua função social.
d – Realizar reforma tributária que promova a simplificação, reduza a insegurança jurídica e institua a progressividade prevista na Constituição Cidadã de 1988, particularmente com impostos sobre grandes patrimônios, em particular atualizar e melhorar a fiscalização do Imposto Territorial Rural, movimentações financeiras e lucros e dividendos distribuídos, este último com grande potencial arrecadatório, como uma das formas de financiamento das urgentes políticas sociais.
e – Promover o crescimento da renda e o pleno emprego com investimentos em infraestrutura, públicos e por concessão ou PPP, retomada do Programa Minha Casa Minha Vida em grande escala e concessão de crédito, pelos bancos públicos, com taxas significativamente mais baixas. O crédito deve ser direcionado, preferencialmente, a projetos de investimentos de grande potencial de encadeamento e geração de emprego, a consumidores e a micro e pequenas empresas. Tais políticas devem ser mais intensas em locais de renda per capita menor e mercado de trabalho mais frágil, com o propósito de reduzir as desigualdades regionais.
f – Revisar a legislação trabalhista e previdenciária, revogando os itens que facilitam a disseminação do trabalho precário, garantindo os direitos aos milhões de trabalhadores que estão nestas condições.
g – Propiciar o crescimento da produtividade, com persistente aumento da qualidade do ensino em todos os níveis; maiores investimentos públicos e incentivos a privados, em ciência, tecnologia e inovação, com maior articulação entre empresas e centros de pesquisa e condicionados a avaliações e metas. Essencial identificar setores estratégicos, como economia digital, de baixo carbono e níveis de grande conteúdo tecnológico nas cadeias globais de valor.
h – Implementar políticas públicas que reduzam a desigualdade social, começando pelo combate à fome, que atinge 33 milhões de brasileiros. Importa fortalecer os programas assistenciais, compensatórios das carências dos segmentos mais vulneráveis, retomando o Bolsa Família, que é vinculado à frequência escolar e vacinação e pode ser melhorado com sua manutenção temporária após ingresso no mercado de trabalho; o Farmácia Popular; o Programa Nacional de Alimentação Escolar e o contínuo aprimoramento e abrangência do SUS, explorando todas as potencialidades de desenvolvimento tecnológico e social, no âmbito do complexo econômico industrial da saúde.
i – Incentivar a participação da mulher economista na sociedade. Desenvolver e estimular a capacitação das mulheres e jovens economistas com vistas a reduzir os entraves tais como: redução salarial e a baixa absorção da mão de obra feminina no mercado. Desenvolver uma agenda pela igualdade de gênero, de acordo com as recomendações do 5º objetivo da Agenda 2030 de desenvolvimento sustentável da ONU.
j – Fazer gestões junto ao Banco Central, para evitar medidas na área cambial que possam comprometer a estabilidade do sistema financeiro nacional e da taxa de câmbio. Nesse sentido, é fundamental revisar a nova legislação cambial para impedir a abertura de contas em moeda estrangeira no país por residentes e preservar o espaço legal para o controle dos fluxos de capitais estrangeiros.
k – Implementar política de desenvolvimento da agricultura familiar, com a democratização do acesso à terra por meio de uma reforma agrária agroecológica.
l – Colocar a questão ambiental no centro da agenda econômica de forma a garantir o desenvolvimento sustentável, combatendo o desmatamento e queimadas e enfrentando os desafios colocados pela emergência climática. Especial atenção deve ser dispensada à Região Amazônica, que deve ser explorada economicamente com projetos que não degradem os seus biomas.
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