Zelenko não ganhou o Nobel e a “cura da cloroquina” é boato
A entrega do Nobel jogou por terra mais uma bravata que estava sendo espalhada na internet
Há alguns meses, defensores do chamado tratamento precoce contra a Covid-19 (que a ciência já mostrou não ter qualquer eficácia) dos Estados Unidos e do Brasil começaram a espalhar uma lorota pesada: a de que Vladimir Zelenko, um dos maiores defensores do uso da cloroquina para a cura da doença, iria receber o Prêmio Nobel da Paz por causa da sua “grande contribuição ao mundo”.
Entre variações da história (como a que dizia que o prêmio seria o Nobel de Medicina), a mensagem se espalhou como forma de fortalecer a tese de que a “cloroquina seria a cura da Covid-19” e se espalhou em espaços “offline” como, por exemplo, a CPI da Pandemia.
Apesar de absurda, a informação era, na época, difícil de checar se fossemos levar em conta apenas dados oficiais por dois motivos: 1) As instituições responsáveis pelo Prêmio Nobel não divulgam a lista de candidatos indicados (eles apenas divulgam os vencedores). 2) A indicação para o Prêmio Nobel é de livre nomeação. Basta um membro de uma universidade ou de um parlamento indicar um nome que ele será aceito.
Ou seja: é possível que algum negacionista tenha, de fato, indicado Zelenko para o Prêmio Nobel. Porém, há uma distância imensa entre “ser indicado” (até você ou eu, se tivermos um “amigo parlamentar” ou “professor de universidade”, podemos ser indicados). E essa é a questão: estava claro que Vladimir Zelenko não ganharia o Nobel da Paz ou o Nobel de Medicina por causa de suas teses em defesa à cloroquina para o tratamento da Covid-19.
O professor em questão, assim como um grupo de cientistas que defendiam o uso do fármaco para o tratamento da doença, continua insistindo em “protocolos” com o remédio que já se mostrou ineficaz em curar a doença (incluindo uma “nebulização com cloroquina”) e atacou vacinas com vídeos sem fundamento. Agora fica a pergunta: há chances de uma figura como essa ganhar um Prêmio Nobel?
Na época que o boato surgiu já apontamos que não. No texto em questão, apontamos que, além de ser impossível “garantir a vitória” de Zelenko, não haveria qualquer lógica em ele ser premiado pelo que fez na pandemia.
O texto foi escrito no Boatos.org em 26 de maio de 2021. Quase cinco meses depois, veio a resposta: Zelenko não ganhou o Prêmio Nobel da Paz. Ao contrário, o prêmio, entregue de forma justíssima, foi para jornalistas que lutam pela liberdade de imprensa e contra as notícias falsas (sim, nos sentimos representados).
Essa história nos deixa mais algumas lições sobre fake news. 1) Muitas vezes, narrativas absurdas e de difícil verificação servem para fortalecer teses falsas. 2) Quando não há como verificar em fontes oficiais, o bom senso é um ótimo aliado para o trabalho de checagem. Afinal, se tivéssemos esperado o resultado do Prêmio Nobel para desmentir esta tese absurda, a narrativa falsa se espalharia por meses sem ao menos alguém para rebatê-la.