Bolsonaro escolhe militares e filiados ao PSL para comissão de mortos e desaparecidos
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O presidente Jair Bolsonaro (PSL) escolheu correligionários e militares para compor a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos do governo federal. A troca ocorre uma semana depois de a comissão ter emitido documento no qual reconhece que a morte de Fernando Santa Cruz, pai de Felipe Santa Cruz, presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), ocorreu "em razão de morte não natural, violenta, causada pelo Estado Brasileiro".
Na última segunda-feira (29), Bolsonaro disse que poderia explicar a Felipe Santa Cruz como o pai dele desapareceu durante a ditadura militar. A declaração foi repudiada por entidades, e a comissão alvo das mudanças desta quinta-feira pediu explicações ao presidente. O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos informou que, apesar de os nomes dos quatro novos membros terem sido divulgados no Diário Oficial da União apenas nesta quinta-feira (1º), as trocas promovidas foram solicitadas em 28 de maio "como parte de iniciativa para otimizar os trabalhos".
"O interesse deste ministério é acelerar o serviço para que os familiares requerentes obtenham a respostas sobre o paradeiro de seus entes queridos", informa a nota. Dos sete integrantes da comissão, três são de livre escolha e nomeação, inclusive o presidente da comissão.
Os outros quatro membros, segundo legislação de 1995, têm que ser oriundos da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, pessoas com vínculos com mortos ou desaparecidos e integrantes do Ministério Público Federal e do Ministério da Defesa. O colegiado foi criado em 1995 no primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso (PSDB).
Ele tem como atribuição reconhecer pessoas desaparecidas que foram assassinadas por terem participado ou terem sido acusadas de participar de atividades políticas e que tenham morrido em virtude de repressão policial sofrida em manifestações públicas ou em conflitos armados com agentes do poder público.
Pela legislação daquele ano, a comissão também trabalha na localização dos corpos de pessoas desaparecidas no caso de existência de indícios quanto ao local em que possam estar depositados e na emissão de parecer sobre os requerimentos de indenização. Dois filiados ao PSL, partido de Bolsonaro e seus filhos, passaram a integrar a comissão. O novo presidente é Marco Vinicius Pereira de Carvalho.
Advogado, natural do Rio de Janeiro, tem 45 anos, é assessor especial da ministra Damares Alves (Mulher, da Família e dos Direitos Humanos) e é filiado ao PSL de Santa Catarina desde março de 2018. Foi candidato a segundo suplente de Lucas Esmeraldino (PSL-SC), derrotado na eleição para o Senado, em 2018. Dez anos antes disputou pelo então PMDB uma cadeira de vereador em Taió (SC). O deputado federal Filipe Barros (PSL-PR) também ingressou no colegiado por integrar a Comissão de Direitos Humanos da Câmara.
Na semana passada, protocolou na PGR (Procuradoria-Geral da República) pedido de prisão temporária do jornalista Glenn Greenwald, fundador do site The Intercept Brasil, que tem publicado desde 9 de junho reportagens com base em diálogos vazados do ministro Sergio Moro e de procuradores da força-tarefa da Lava Jato. Em 31 de março deste ano, o deputado defendeu em uma rede social que se comemorasse o golpe militar.
"31 de Março. O dia que o Brasil foi salvo da ditadura comunista. O dia da contra-revolução. Esses são os fatos históricos. O resto é revisionismo. É um dia a ser comemorado SIM", escreveu o parlamentar. Em uma outra postagem feita no mesmo dia, ao responder a um internauta, o deputado publicou: "Negar que se não fossem os militares, em 1964, o Brasil teria se transformado numa ditadura comunista é, no mínimo, desonestidade intelectual. Esse é o fato. Não venha com bravatas de senso comum".
Os outros dois novos membros da comissão são militares. O coronel reformado Weslei Antônio Maretti e o oficial do Exército Vital Lima Santos, assessor do chefe de gabinete do ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva. Deixaram o grupo Eugênia Augusta Gonzaga Fávero, procuradora da República e ex-presidente da comissão, Rosa Maria Cardoso da Cunha, ex-integrante da Comissão da Verdade e defensora de perseguidos políticos, João Batista da Silva Fagundes, coronel da reserva e ex-deputado e o deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS). Eugênia, Rosa e Pimenta haviam sido indicados pela então presidente Dilma Rousseff (PT). A primeira, em 2014. Os demais, em 2015.
Já João Batista foi indicação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em 2003. Da antiga configuração, permanecem Ivan Cláudio Garcia Marx, representante do Ministério Público Federal, e duas representantes de familiares, Diva Soares Santana e Vera Silva Facciola Paiva. Diva foi nomeada em dezembro de 2005 por Lula. Ivan e Vera são nomeações feitas por Dilma em 2015.
Na manhã desta quinta-feira, Bolsonaro disse que a mudança de quatro dos sete integrantes se deu pelo fato de agora o Brasil ter um governo de direita.
"O motivo [é] que mudou o presidente, agora é o Jair Bolsonaro, de direita. Ponto final. Quando eles [governos anteriores] botavam terrorista lá, ninguém falava nada. Agora mudou o presidente. Igual mudou a questão ambiental também", afirmou o presidente da República. Em nota, o Instituto Vlademir Herzog repudiou o que considerou o aparelhamento da comissão.
"O aparelhamento da Comissão é o auge da inaceitável ofensiva de Bolsonaro contra todas e quaisquer políticas públicas que garantem à sociedade o direito à memória, à verdade e à justiça dos crimes cometidos durante a ditadura militar entre 1964 e 1985", diz a nota.
O instituto diz ainda que "exige que as instituições do Estado brasileiro impeçam o aparelhamento e o desmantelamento da Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos e que o governo pare de atacar as políticas públicas de direito a memória, verdade e justiça, que são absolutamente fundamentais para a consolidação e o fortalecimento da democracia no Brasil". A nota do instituto afirma também que "Brasil não pode mais conviver com tentativas grosseiras de revisionismo histórico e com relativizações das gravíssimas violações de direitos humanos cometidas durante a ditadura militar, especialmente quando isso parte de quem ocupa a presidência da República".
- QUEM É QUEM NA COMISSÃO SOBRE MORTOS E DESAPARECIDOS POLÍTICOS
NOVOS INTEGRANTES Marco Vinicius Pereira de Carvalho, atual presidente do colegiado - Advogado, natural do Rio de Janeiro, tem 45 anos, é assessor especial da ministra Damares Alves (Mulher, da Família e dos Direitos Humanos) e é filiado ao PSL de SC desde março de 2018. Foi candidato a segundo suplente de Lucas Esmeraldino (PSL-SC), derrotado na eleição para o Senado, em 2018. Dez anos antes disputou pelo então PMDB uma cadeira de vereador em Taió (SC).
Weslei Antônio Maretti - Coronel militar reformado
Vital Lima Santos - Oficial do Exército, é assessor do chefe de gabinete do ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva
Filipe Barros Baptista de Toledo Ribeiro - Deputado federal pelo PSL-PR, integrante da Comissão de Direitos Humanos da Câmara. Na semana passada, protocolou na PGR (Procuradoria-Geral da República) pedido de prisão temporária do jornalista Glenn Greenwald, fundador do site The Intercept Brasil
INTEGRANTES REMANESCENTES Ivan Cláudio Garcia Marx - Representante do MPF. Nomeado por Dilma Rousseff (PT) em 2015
Diva Soares Santana - Representante dos familiares. Nomeada em 2005 por Luiz Inácio Lula da Silva (PT)
Vera Silva Facciola Paiva - Representante dos familiares. Nomeada em 2015 por Dilma Rousseff (PT)
INTEGRANTES QUE FORAM SUBSTITUÍDOS Eugênia Augusta Gonzaga Fávero - Procuradora da República, ex-presidente da comissão. Havia sido nomeada em 2014 por Dilma Rousseff (PT)
Rosa Maria Cardoso da Cunha - Ex-integrante da Comissão da Verdade e defensora de perseguidos políticos
João Batista da Silva Fagundes - Coronel da reserva e ex-deputado. Estava na comissão desde 2003, nomeado por Luiz Inácio Lula da Silva (PT)
Paulo Roberto Severo Pimenta - Deputado federal do PT-RS. Nomeado em 2015 por Dilma Rousseff (PT)
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