Violência e terror: o poder público parece refém das facções criminosas
Ocorreram alguns ataques a unidades da polícia, mas o grosso das ações foram assaltos a passageiros e incêndio de ônibus, supermercados, postos de saúde, ambulâncias, etc.
Os episódios violentos promovidos por uma facção criminosa no Rio Grande do Norte durante a semana são verdadeiramente aterrorizantes. Especialistas falam em tática terrorista pelo fato de os criminosos praticarem ações com o intuito específico de causar medo à população e espalhar o terror na região. Ocorreram alguns ataques a unidades da polícia, mas o grosso das ações foram assaltos a passageiros e incêndio de ônibus, supermercados, postos de saúde, ambulâncias, etc.
A tática terrorista pode ter sido aprimorada, mas os ataques registrados em mais de 30 cidades do Rio Grande do Norte não são uma novidade. Organizações criminosas já tocaram o terror em outros Estados para protestarem contra as condições de presídios, prisões ou mortes de líderes criminosos ou ações mais fortes da polícia contra o tráfico de drogas.
Fato é que as organizações criminosas se solidificaram no país e hoje se dão ao luxo de reivindicaram direitos praticando crimes violentos, semeando o terror e acuando a polícia. A impressão reinante é que o poder público se encontra refém do crime organizado violento.
Há um número que reforça essa impressão. O Brasil já conta com 53 facções criminosas. O PCC (Primeiro Comando da Capital), de São Paulo, é a maior, tem caráter nacional, e é a mais organizada. Teria 35 mil integrantes. Outra organização nacionalizada é o Comando Vermelho, do Rio de Janeiro. Segundo a revista Veja, a estimativa é que a facção conte com 30 mil integrantes. Outras têm dimensão regional, mas hoje todos os Estados têm suas próprias facções, que se rivalizam e atuam de forma coligada a grupos de maior força. A Okaida da Paraíba já teria mais de 5 mil integrantes.
Por que Estado (União e unidades federativas) permitiu que o crime organizado crescesse tanto?
É de estarrecer, mas a existência de facções criminosas organizadas no Brasil está perto de completar meio século. O Comando Vermelho nasceu em 1979. Foi se dividindo e se espalhando ao longo do tempo, dando cria a dezenas de outras falanges criminosas. O PCC já está fazendo 30 anos, internacionalizado e ostentando um elevado grau de sofisticação.
Como o Estado permitiu que o crime organizado chegasse a tanto?
Já ouve um tempo em que se atribuía o crescimento da criminalidade à pobreza e ao desemprego. Não é bem assim. Há países e regiões pobres que não têm tanta criminalidade.
Noutros momentos, especialistas aludem a ausência do Estado nas comunidades, com suas políticas sociais e equipamentos de educação, saúde e segurança, como uma das causas do avanço do crime organizado.
O tema é complexo. Existiriam muitas causas. Destaque-se, porém, o registro de um comportamento padrão de governos (nacional e estaduais) em relação ao crime organizado ao longo dos últimos anos que pode explicar o estúpido avanço das forças criminosas. Nunca existiu um plano consistente de enfrentamento ao crime organizado. Aqui ou acolá, algum governador até executou algum programa um pouco mais arrojado de combate ao crime, mas sempre houve recuo pouco tempo depois. Nacionalmente, nunca houve uma iniciativa capaz de ameaçar o crime organizado violento.
O padrão tem sido o poder público fazer de conta que se combate as falanges criminosas, mas deixando espaço para que elas se fortaleçam e permaneçam atuando. Do outro lado, as facções até reduzem alguns tipos de crime para evitar reações mais fortes do Estado, porém não param e se expandir. Parece até haver um acordo mútuo (não assinado ou celebrado, evidentemente) de tolerância e convivência das duas partes. A suspeita não é infundada.
Triste é a pergunta, sem resposta, que todo esse quadro impõe: tem o Estado (União e unidades federativas) condições de enfrentar as facções criminosas nesse momento no Brasil?